RE - Número 26 - Julho de 2002
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- Envelhecimento demográficoPublication . Martins, Rosa Maria LopesDesde tempos perdidos no passado, que a problemática do envelhecimento tem sido assunto do âmbito filosófico. Disse Platão que toda a "filosofia é uma meditação relacionada com a morte". As terapias propostas eram, e foram através dos tempos, alicerçadas em crenças mágicas e obscuras e reduzidas a elixires de juventude que visavam suprimir os efeitos do curso da idade (Gyll, 1998). É nos pós-guerra Mundial (segunda) e guerra civil de Espanha que o envelhecimento da população começa a sobressair e a chamar a atenção dos responsáveis pela saúde. Em Portugal, é na década de 50, com o pioneiro José Reis, que começam a surgir as primeiras preocupações geriátricas. Apesar do esforço e da sua persistência para impulsionar o interesse por uma nova doutrina médica - a Geriatria - a favor dos seres humanos até então singularmente negligenciados continuou a pensar-se e a agir-se segundo modelos tradicionais de prevenção, de diagnóstico, de tratamento e de prognóstico, e muito poucas vezes de reabilitação. O aumento da longevidade e dos aspectos a ela inerentes fazem do fenómeno envelhecimento uma questão de estudo actual, que merece uma reflexão mais aprofundada do ponto de vista da saúde. Pensou-se durante muito tempo que a "explosão demográfica da terceira idade" era uma consequência directa do aumento da esperança de vida, no entanto esta hipótese não foi confirmada porque sabe-se hoje que o principal factor responsável por este fenómeno é o declínio da natalidade (Nazareth, 1994). As alterações na estrutura etária da população portuguesa, diz-nos Dinis (1997), traduzem-se fundamentalmente pelo aumento da população, que resulta: Da diminuição constante da taxa de natalidade: em que as gerações deixam de ser substituídas numericamente e o lugar dos adultos e dos "velhos" aumenta no total. O declínio da taxa de natalidade está associado a diversos fenómenos, como a redução da nupcialidade, o casamento tardio, a emancipação da mulher e a sua maior participação no mercado de trabalho. Também a generalização dos métodos contraceptivos e os encargos sociais acrescidos decorrentes de uma família numerosa são factores que condicionam uma baixa de nascimentos; Do aumento "significativo" da esperança de vida, resultante das melhores condições sociais e tecnológicas, dos progressos da medicina preventiva, curativa e reabilitadora. Nazareth (1998) acrescenta que: "para além da dinâmica das inter-relações entre mortalidade e natalidade não podemos ignorar o conceito de "nicho ecológico humano". O homem é um ser dotado de uma grande mobilidade e as migrações, ao serem selectivas, produzem necessariamente impactos estruturais importantes. A conjugação de todos estes factores convergem para mudanças significativas no contexto demográfico e começam a acarretar uma série de previsíveis consequências sociais, culturais e epidemiológicas que merecem, de facto, uma reflexão aprofundada.
- Características psicológicas associadas à saúde: a importância do auto-conceitoPublication . Albuquerque, Carlos; Oliveira, Cristina Paula Ferreira dePara compreensão do processo do desenvolvimento humano, torna-se imprescindível o recurso ao auto-conceito (Gecas,1982). Devido à sua importância, tal constructo tem sido estudado nas diversas áreas da Psicologia, das quais salientamos a Psicologia da Educação (Burns,1979; Crook,1984, Veiga, 1988, 1989), Psicologia Clínica (Vaz Serra,1986; Vaz Serra e Firmino,1986; Vaz Serra et al.,1986) e Psicologia Social (Gecas,1982; Neto,1986). Segundo Burns (1986), o auto-conceito é composto por imagens acerca do que nós próprios pensamos que somos, o que pensamos que conseguimos realizar e o que pensamos que os outros pensam de nós e também de como gostaríamos de ser. Para este autor, o auto-conceito consiste em todas as maneiras de como uma pessoa pensa que é nos seus julgamentos, nas avaliações e tendências de comportamento. Isto leva a que o auto-conceito seja analisado como um conjunto de várias atitudes do eu e únicas de cada pessoa. O auto-conceito tem um papel extremamente importante na medida em que tenta explicar o comportamento, ou seja, porque consegue manter uma certa consistência nesse mesmo comportamento, explicita a interpretação da experiência e fornece um certo grau de previsão (Burns,1986). Epstein (1973) afirma mesmo que "para os fenomenologistas, o auto-conceito é o constructo central da Psicologia, proporcionando a única perspectiva através da qual o comportamento humano pode ser compreendido" (p.404). Assim, é nosso propósito abordar, neste artigo, o papel que o auto-conceito desempenha no comportamento do indivíduo, tendo em conta que a interacção dos diferentes factores contribui, de forma salutar, para a sua formação e desenvolvimento e, consequentemente, para todo o desenvolvimento e comportamento pessoal e social. Começaremos por traçar uma pequena resenha histórica sobre as origens do interesse pelo auto-conceito e tentaremos clarificar alguns aspectos relevantes para a sua definição, para a sua estrutura e para o seu conteúdo. Finalmente, concluiremos esta análise destacando alguns resultados de investigações que se têm efectuado no âmbito do estudo do auto-conceito.
- Correntes de pensamento em ciências de enfermagemPublication . Silva, Daniel Marques daTal como noutras profissões, a evolução na enfermagem tem ocorrido em contextos vários de mudanças socioculturais, filosóficas, económicas, políticas e tecnológicas. Da tecnicidade centrada na doença, no inicio deste século, passou-se para uma corrente de valorização da relação entre quem presta e quem recebe cuidados e para uma corrente orientada para o desenvolvimento moral. Os cursos de enfermagem de hoje procuram dar uma formação que permita aos enfermeiros conhecer melhor a pessoa e ter uma acção terapêutica a nível individual e familiar. A imagem tradicional da "boa enfermeira" é assim, hoje, questionada pois a percepção que as enfermeiras tinham do seu papel foi posta em causa. Desde Nightingale que os cuidados de enfermagem se desenvolveram e melhoraram extraordinariamente e os enfermeiros sabem, cada vez mais, atribuir a si próprios a sua identidade profissional. Apesar da tecnologia avançar, esta nunca poderá substituir a enfermeira uma vez que só ela poderá oferecer serviços que englobam todas as dimensões do ser humano. Contrariamente ao contabilista ou ao engenheiro, para quem a pessoa do cliente não constitui o objecto directo da sua competência, para o enfermeiro é precisamente o ser humano em toda a sua força e vulnerabilidade que constitui o objecto da sua competência. Ser enfermeiro exige mais do que o simples saber (ele pode memorizar) e do que saber-fazer (os gestos podem tornar-se automáticos). O enfermeiro deve também desenvolver o seu saber-ser, tanto consigo próprio como com o cliente. Se, por um lado, a evolução tecnológica tem apelado à valorização da vertente tecnicista, por outro, o aumento da esperança de vida, com o consequente envelhecimento da população e o prolongamento de situações incuráveis (doenças crónicas), tem evidenciado a necessidade de cuidados mais relacionados com a área afectiva e relacional. Nas linhas seguintes iremos procurar, de forma breve, perspectivar a evolução verificada na prática dos cuidados e simultaneamente apresentar algumas correntes de pensamento que têm influenciado a forma de encarar a pessoa, a saúde, a doença e o ambiente, bem como a prestação dos cuidados.
- A companhia de Jesus face ao espírito moderno (2.ª Parte)Publication . Monteiro, Miguel CorrêaPor toda a primeira metade do século XVII, os comentários dos Conimbricenses estavam na base da Filosofia seguida em Portugal não só nos Colégios e Escolas dos Jesuítas, mas nas outras Congregações religiosas também, enquanto na segunda metade do século e em princípios do século XVIII a Filosofia seguida pelos jesuítas é que está explicada no Curso de Soares Lusitano, que se vai basear na ciência proposta pelo jesuíta italiano Cristóvão Borri, ciência essa que ía de encontro ao ensino ministrado nas escolas portuguesas orientadas segundo o texto dos Conimbricenses. A Matemática em Portugal não teve, no tempo, desenvolvimento, e todas as Histórias da mesma que se conhecem são deficientes. De apontar, apenas, a de Stockler. Na Medicina podemos referir um trabalho do Dr. João Marques Correia, o Tratado physiologico médico-physico e anatómico da circulação do sangue, onde o nome de Descartes aparece com o epíteto de Sapientíssimo, e outro bem conhecido estrangeirado ( Jacob de Castro Sarmento ( que pretende tornar conhecido em Portugal o nome e a obra de Newton combatendo Descartes na Teórica Verdadeira das Marés. Outro médico, estrangeirado, pouco conhecido, como aliás acontece com quase todos os considerados pequenos estrangeirados do século XVIII, e que Barbosa Machado considera «acérrimo sequaz da filosofia de Descartes, é o Dr. Francisco Xavier Leitão, falecido em 1739, homem muito viajado pelas cortes da Europa que constantemente atraíam os portugueses cultos. Estes, sabiam ir encontrar lá fora as sementes do moderno pensamento universal cujos frutos brotariam na segunda metade do século XVIII. No campo da Astronomia, Portugal acompanha a deserção das teorias aristotélicas que se registou pela Europa nos princípios do século XVII. A Astronomia restaurada deve-se, principalmente, às experiências feitas no Observatório astronómico de Santo Antão onde os jesuítas, como Bocarro, Carbone, Borri, Teles, Soares e outros trabalharam e deram a conhecer ao estrangeiro as observações feitas em Portugal. É bastante difícil esquematizar as causas que levaram Portugal, se não a um isolacionismo, em que não acreditamos na medida em que não foram extintas completamente as relações culturais com o estrangeiro, apesar de esporádicas, pelo menos a uma crise em relação ao que se passava além fronteiras, crise cultural que está relacionada estreitamente com a decadência política que o domínio filipino provocara e que só o reinado de D. João V consegue, em parte, superar. As causas que normalmente se apontam são a existência da Inquisição, da censura, e o ensino dos Jesuítas.
- Ensino Secundário Liceal na 1ª RepúblicaPublication . Cunha, Maria Helena S. de Oliveira eA monarquia reconhecera, no início do século XX, o perigo em que as instituições se encontravam. Dados do "Anuário Estatístico do Reino de Portugal", de 1907, documentam que o censo de 1900 revelara a existência de uma percentagem de analfabetos de 78,6%, mais elevada nas faixas etárias dos 6 aos 19 anos - 78,4% - do que na população com mais de 20 anos - 73,4% (Carvalho, 1986, p. 635) e, nas palavras do mesmo autor, o poder "desejou mostrar à Nação a sua vitalidade" produzindo, "num afã incansável", legislação sobre todas as matérias, criando, reorganizando, regulamentando (p. 639). Exemplos significativos destas iniciativas legislativas, entre outros, frequentemente sem medidas de implementação, ou com concretização deficiente: reorganização da Direcção-Geral de Instrução Pública (1901); criação de escolas infantis para as crianças dos 4 aos 6 anos (1901); introdução de importantes alterações estruturais no ensino primário (1901); reorganização do ensino comercial e industrial em 1901 e em 1903; desdobramento do ensino agrícola (1901) em ensino técnico superior, técnico secundário, profissional geral, profissional especial e em ensino primário rural; reorganização (1901) do Instituto de Agronomia e Veterinária, que havia sido fundado em 1864. No âmbito do ensino secundário, as medidas mais significativas (e delas se falará mais desenvolvidamente adiante) foram as da Reforma de 1905, de Eduardo José Coelho, e a da criação de um liceu feminino em Lisboa, em 1906, aproveitando-se a Escola Maria Pia, já existente, fundada em 1885 pelo Município da capital. Estas iniciativas legislativas, porém, não conseguiram fazer sair do marasmo a vida nacional. Escrevendo sobre o movimento académico de 1907, originado na reprovação de um candidato ao doutoramento na Universidade de Coimbra, e que se alargou a estudantes do liceu de Coimbra e de Lisboa, Mário Braga1 refere que as ocorrências correspondiam "a mais um acto de uma peça trágico-cómica", com representações de séculos, "no palco das nossas instituições docentes", constituindo a greve de 1907 uma rejeição de um "enfermidade crónica da escola lusitana", causadora do "pasmo cultural do país, desprestigiando-o no estrangeiro, enfraquecendo-lhe o organismo social" (pp.9-10).
- Métodos imunológicos na detecção e determinação de aflatoxinas em alimentos: vantagens e inconvenientesPublication . Amado, Maria AméliaAs aflatoxinas são micotoxinas produzidas por espécies do género Aspergillus. Merecem especial atenção por parte da indústria dos alimentos, porque são substâncias altamente tóxicas e carcinogenéticas para o homem e animais. Este facto levou, nos últimos anos, a uma intensa investigação no sentido de as detectar e pervenir, utilizando diversos métodos analíticos. Entre eles encontram-se os métodos imunológicos, que irão ser tratados neste artigo, destacando-se as suas principais vantagens e inconvenientes.
- The Power Quality Panorama in PortugalPublication . Delgado, Joaquim Duarte Barroca; Almeida, Aníbal Traça de; Saraiva, Pedro AndradeThe problems that affect the electrical sector in Portugal are likely to be similar to other countries, since the types of equipment (and loads) used in the industry and service sectors are nowadays almost universal. Liberalization is now making its first steps in Portugal, leading to discussions and additional pressure for providers to increase the quality levels provided to consumers. But do the consumers have sufficient known-how about the new problems that affect the sector today? Are they adopting the correct measures for dealing with the emerging problems related with non-linear loads proliferation, more sensitive equipments, etc.? Based on these realities, facts and the perception that power quality related problems in Portugal are still at an early perception stage, when compared with other countries, we conducted a detailed survey, focusing on the more demanding activities (premium power consumers), in order to identify the present levels of knowledge, needs and opinions about power quality. For the Portuguese companies power quality related problems are mainly centered (almost exclusively) around interruptions. From an immediate economical perspective, the continuity of supply is effectively the first priority, but all the other dimensions of power quality receive very little attention, although they are also very important factors for industrial competitiveness.
- O melhor de nós: ignorância? Confusão? Medo? Coragem? Determinação? Solidariedade?...Publication . Amaral, Maria JoãoAlguns meses após ter aceite o convite para participar nos Encontros de Didáctica promovidos pela ASA-CRIAP, dei-me conta que, desta vez, me sentia muito mais insegura do que em anteriores situações semelhantes. Não sabia por onde começar, pois não encontrava as receitas que provavelmente trouxeram alguns professores a estar presentes neste fórum. Nunca fui muito adepta de receitas, nem mesmo na cozinha...! Sentia-me e sinto-me um pouco perdida porque é também assim que sinto muitos dos Colegas com quem contacto nas escolas, para já não falar dos meus estagiários. No meio de todas estas dúvidas e numa tentativa de as esquecer e de matar Saudades de Nova Iorque, lendo Pedro Paixão (2000:83), comecei a estabelecer convosco um diálogo imaginário que poderia vir a ocorrer: Como se sente? Perguntaríeis, e eu teria de responder: Confuso[ a] . Logicamente interpelar-me-iam: [ Então] Porque veio até cá? Não sei de facto dizer-lhe[ s] porquê. No momento presente, estas palavras não pretenderiam senão encontrar uma saída para ter "embarcado" em mais este desafio, ignorante que estava (não estamos todos?) das exigências e das angústias que as mais recentes convulsões e incertezas sobre a Educação estão a causar. Na altura, foi-me proposto que falasse sobre os novos referentes programáticos e sobre as novas áreas curriculares. Teria que me documentar... que estudar umas coisas... mas isso até seria positivo para as minhas aulas de Didáctica e para as minhas funções de Supervisora de estágios ... Não era nada a que já não estivesse habituada...! Lá fui lendo as "novidades"; fui a um Congresso sobre Currículo ... mas cada vez me sentia mais incapaz de vir "debitar" receitas. Desengane-se por isso quem espera encontrar certezas nas minhas palavras. Através do contacto diário com Colegas nas escolas que frequento e/ou onde lecciono, só encontro angústias ..., ouço queixas sobre o excesso de trabalho que nos é exigido ..., discussões entre os mais descrentes ou os totalmente avessos às mudanças e aqueles que ainda crêem ser possível fazer algo. O panorama não é agradável e criou, também em mim, alguma ansiedade para enfrentar aquele momento e aquele público. Como já disse antes, não sou, e se calhar nunca fui, apologista de receitas mágicas... Em Educação, e concretamente no ensino da língua Inglesa, nunca as houve ou haverá...
- Tradição e inovação na pena de John Ruskin e Alexandre HerculanoPublication . Melão, DulceAlexandre Herculano (1810-1877) e John Ruskin (1819-1900) conferiram uma nova vitalidade ao passado, entretecendo-o de ficções e realidades que cativaram os leitores do seu tempo e lhes abriram novos horizontes. Se é certo que não foram os únicos a lançar mão do passado para sanar os males do seu século, o modo como exploraram tal filão, metamorfoseando épocas passadas numa amálgama rica em tradições inovadas, merece um olhar atento. Ruskin foi muitas vezes guiado por Walter Scott quer em termos pessoais, quer em termos da obra que produziu, considerando a Idade Média a época que mais riquezas trouxe à humanidade. Herculano, como é sabido, inspirou-se em Scott para criar o seu romance histórico e nunca escondeu a sua admiração pelo escritor Escocês. Tal como Ruskin, Herculano não poupou elogios à Idade Média demonstrando, quer nos seus romances históricos, quer em diferentes momentos da sua vida nas reflexões que deu a lume, ser essa a época onde urgia buscar antídoto para combater os males da sociedade sua contemporânea. O passado funcionou para Ruskin e Herculano como alternativa não passiva ao presente corrupto e degradado que denunciaram sem temor. Não sendo possível, nem sequer desejável, demonstrar de forma absoluta o modo com Herculano e Ruskin (re)interpretaram o passado em Portugal e Inglaterra, respectivamente, optámos por reflectir sobre a forma como ambos encararam o passado nacional e lançar um olhar interessado ao modo como Ruskin equaciona o seu passado individual. Em primeiro lugar, teremos em consideração as estratégias que ambos adoptaram para (re)ver o passado e o modo como os dois escritores apresentaram propostas válidas de mudança à sociedade do seu tempo. Em segundo lugar, acompanharemos de perto a forma como na sua autobiografia Ruskin estabelece pactos com passados reais e imaginados no intuito de se descobrir a si próprio.